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Glauce (também chamada de Creúsa em algumas versões)

Glauce

Publicado em Quinta-feira,

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A Filha do Rei de Corinto

Glauce nasceu como filha do poderoso rei Creonte de Corinto, uma princesa grega de beleza serena, refinada educação e comportamento exemplar. Cresceu entre colunas de mármore e jardins suspensos, destinada a unir a realeza coríntia a outros tronos. Seu nome significa “azulada”, refletindo talvez seus olhos ou sua aura límpida. Mas apesar da tranquilidade aparente, o destino de Glauce não era doce como seu nome. Ela estava destinada a viver uma das tragédias mais brutais da mitologia grega, marcada por alianças políticas, rivalidade entre mulheres e uma morte terrível.

A Chegada de Jasão e Medeia

Quando Jasão e sua esposa Medeia chegaram ao reino de Creonte, após fugirem de Iolco, o rei os acolheu com respeito. Jasão era um herói famoso, líder dos Argonautas e vencedor do velocino de ouro. Medeia, por outro lado, era vista com cautela. Embora tivesse prestígio como filha de Eetes e neta de Hélio, sua fama como feiticeira e os rumores de crimes passados causavam inquietação. Ainda assim, durante um tempo, os dois viveram em Corinto, tiveram filhos, construíram uma vida. Mas Jasão queria mais. E foi aí que Glauce entrou na história.

A Proposta de Aliança

Com o tempo, Jasão percebeu que sua união com Medeia era um fardo político. Ela não era bem-vinda, não era grega, não era confiável. Ao olhar para Glauce, filha legítima do rei, jovem, bela e dotada da simpatia popular, Jasão viu uma oportunidade. Pediu a mão dela em casamento, prometendo romper com Medeia e se aliar definitivamente a Corinto. Creonte aprovou. Para ele, era a chance de unir sua filha a um herói e fortalecer seu poder. Glauce, inocente ou ambiciosa, aceitou a proposta. Não se sabe se amava Jasão. Mas o casamento foi marcado.

A Fúria de Medeia

Quando Medeia descobriu que Jasão a abandonaria para se casar com Glauce, a fúria foi devastadora. Sentiu-se traída como mulher, humilhada como rainha, substituída como esposa e apagada como mãe dos filhos de Jasão. Ela implorou, gritou, ameaçou. Jasão respondeu com frieza, dizendo que fazia aquilo pelo bem dos filhos — e que ela deveria aceitar seu lugar. O rei Creonte, temendo a fúria da feiticeira, decretou que Medeia fosse exilada imediatamente. Mas ela pediu um único dia antes de partir. Esse tempo seria suficiente para mudar o destino de Glauce para sempre.

O Presente de Casamento

Medeia enviou à futura noiva um presente de casamento: uma coroa e um vestido magnífico, feitos de ouro, seda e pedras preciosas. Glauce recebeu o presente com alegria, encantada com a beleza das peças. Acreditou que era um sinal de reconciliação ou submissão da rival. Vestiu o traje imediatamente. A lenda conta que, ao colocar a coroa na cabeça e o vestido sobre o corpo, a magia oculta nos tecidos foi ativada. Uma chama invisível, mágica, começou a se espalhar lentamente, como um veneno que aquece. O fogo subiu pelos braços de Glauce. Ela gritou.

A Morte em Chamas

O fogo mágico consumiu o vestido, depois os cabelos, depois a carne. Mas não era fogo comum — era algo que resistia à água, que queimava como ácido, que se alimentava do próprio ar. Glauce correu pelo palácio, tentando arrancar o vestido, implorando por socorro. Nenhum escravo ousava tocá-la. Os gritos ecoaram pelas colunas de mármore. O rei Creonte entrou na sala e, ao ver a filha em chamas, correu para abraçá-la. Mas o feitiço era impiedoso. O fogo passou para ele. Ambos tombaram juntos, pai e filha, numa imagem que marcaria a memória de Corinto para sempre.

Jasão Chega Tarde Demais

Jasão, ao saber da tragédia, correu ao palácio. Encontrou o salão envolto em fumaça, corpos carbonizados, criados em pranto. Sua noiva estava morta, seu sogro também. E a assassina, sua ex-esposa, havia sumido. Ele compreendeu, naquele instante, a extensão da ira de Medeia. Mas o pior ainda estava por vir. Quando correu para ver seus filhos, descobriu que Medeia os havia assassinado também, arrancando-lhe tudo o que amava. Glauce foi a primeira a cair — mas o rastro de dor se estendeu por todo o sangue de Jasão.

A Versão Alternativa: A Queda Mortal

Em algumas versões menos conhecidas da lenda, Glauce não morre queimada. O vestido provoca uma dor intolerável, mas ela sobrevive por tempo suficiente para correr até uma fonte. Ao mergulhar, a água entra em combustão junto com a magia, transformando a fonte num local amaldiçoado. Noutra versão ainda, Glauce, desesperada, corre para uma torre e se joga, morrendo despedaçada nas pedras. Mas todas as variantes compartilham o mesmo fim: a jovem que foi prometida a um herói morre por causa da mulher que ele desprezou.

A Reação de Corinto

A morte da princesa causou comoção nacional. O povo de Corinto lamentou profundamente. Glauce era amada pelo povo, símbolo de juventude e esperança. Sua morte foi vista como um ato de guerra, um ataque mágico. Por séculos, histórias sobre seu sofrimento foram contadas para assustar crianças e alertar rainhas. O nome de Medeia foi amaldiçoado. E embora ela tenha fugido, jamais deixou de ser lembrada como a assassina da princesa. A fonte onde Glauce morreu (em certas versões) virou um local de luto, e seu nome ecoou como símbolo de pureza destruída.

O Nome Esquecido na Tragédia de Eurípides

Na peça “Medeia” de Eurípides, Glauce é chamada de Creúsa. A obra não dá grande espaço à sua perspectiva: ela é uma figura silenciosa, que serve de instrumento para a vingança de Medeia e para mostrar a fraqueza de Jasão. Seu nome raramente é citado. Não há falas. Mas mesmo como figura ausente, sua presença é central. Ela é o símbolo do mundo que Medeia não pode mais tocar — o mundo da juventude, do poder masculino, da ordem social que exclui a mulher estrangeira e perigosa. Creúsa, mesmo sem fala, é essencial ao colapso da tragédia.

Glauce no Imaginário Simbólico

Ao longo dos séculos, Glauce tornou-se símbolo de mulheres sacrificadas pelas decisões de homens. Seu erro, aos olhos de muitos, foi confiar. Em Jasão, que a usou como moeda política. Em Medeia, que parecia render-se. Em seu pai, que acreditou que a realeza a protegeria. A tragédia de Glauce ecoa em obras de arte, peças teatrais, óperas e romances. Alguns a pintam como vítima pura, outros como jovem ambiciosa punida por desafiar a esposa legítima. Seja como for, sua morte brutal permanece uma das mais impactantes da mitologia clássica.

A Força do Injustiçado

Enquanto Medeia representa a vingança ativa, Glauce é o rosto da injustiça passiva. Não cometeu crimes, não desejou o mal de ninguém — mas morreu queimada viva por algo que nem havia começado. Sua história é a do colateral, da vítima esquecida, da mulher jovem devorada pelas paixões e guerras dos outros. Em suas cinzas está o retrato de tantas figuras mitológicas femininas cuja única falha foi estar no lugar errado, na hora errada, ao lado do homem errado.

As Damas Silenciadas da Mitologia

A mitologia grega está repleta de personagens como Glauce: mulheres cujas histórias são definidas pelas escolhas dos outros. Como Ifigênia, sacrificada por seu pai. Como Andrômeda, acorrentada por causa da vaidade da mãe. Como Cassandra, condenada por um deus que ela rejeitou. Glauce está entre elas — mas sua morte, tão cruel e gráfica, rompe os limites do sacrifício simbólico. Seu corpo em chamas é uma imagem que mesmo o tempo não apaga.

O Que Teria Sido

Se Jasão não tivesse traído Medeia. Se Glauce tivesse recusado o casamento. Se Creonte tivesse exilado Jasão em vez de Medeia. Há muitos "e se" na história de Glauce. Mas a mitologia raramente lida com possibilidades. Ela trabalha com fatalidade. Glauce nasceu princesa, mas morreu vítima. Não por suas escolhas, mas pelos caprichos de deuses e homens. E mesmo em silêncio, sua história grita por justiça até hoje.

A Última Tocha

Alguns relatos tardios dizem que, em certas cidades, festas eram realizadas em honra a Glauce como uma mártir. Fontes dedicadas, cânticos tristes e procissões com tochas. Seu nome era invocado por mulheres que temiam ser substituídas, esquecidas, traídas. Com o tempo, essas tradições se perderam, mas seu nome continuou ecoando em tragédias, teatros e canções. Glauce, a princesa que brilhou por um instante antes de ser consumida pelo fogo, virou símbolo do amor sem escolha.